Bagaço de cana, ‘resíduo’ cada vez mais lucrativo
visita 07/10/2008: http://www.bv.fapesp.br/namidia/?act=view&id=25240

Geração de bioeletricidade, venda de créditos de carbono, alimentação animal e insumo para adubação orgânica. Esses são os atuais usos de um subproduto da indústria de açúcar e álcool que, até o início da década de 90, era considerado um problema e muitas vezes dado de graça pelas usinas: o bagaço de cana.
Hoje, cada vez menos vendido ou cedido a terceiros pela agroindústria canavieira, o bagaço virou o insumo principal para garantir a auto-suficiência energética das usinas.
Nesta safra, não fosse a utilização do bagaço principalmente para geração de energia, pelo menos 140 milhões de toneladas do resíduo – de uma safra prevista pela Conab em 570 milhões de toneladas – estariam abarrotando os pátios das usinas, já que, de cada tonelada de cana sobram 250 quilos de bagaço, conforme o especialista em bioeletricidade Onório Kitayama, da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), que representa 117 usinas produtoras de açúcar, álcool e bioenergia.
Álcool celulósico
E o futuro guarda um uso ainda mais nobre para o antes resíduo e agora “co-produto”: a produção do álcool de segunda geração, feito a partir da hidrólise do bagaço. “O mundo inteiro está pesquisando isso”, diz o engenheiro agronômo especialista em usinas de álcool Rodrigo de Campos. No Brasil, o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) e a Dedini trabalham com tais pesquisas. O que vai definir, porém, no futuro, se o bagaço será destinado à queima para gerar bioeletricidade ou à produção de etanol celulósico será o mercado. “A tendência será privilegiar o mais lucrativo”, diz Campos.
Pellets
Ainda na questão energética, o bagaço tem sido pesquisado também para ser transformado em pellets, exportados para a Europa para geração de energia. “O bagaço é prensado em bloquinhos, mais fáceis de serem transportados”, explica Campos. “Atualmente algumas usinas vendem o bagaço solto para a indústria de suco de laranja, por exemplo. Com pellets, poderiam lucrar mais, pois o bagaço fica concentrado e com maior capacidade de geração de energia.”
Não só o bagaço está na mira da pesquisa para produção do álcool celulósico, mas também a palha, deixada no campo em grandes quantidades após a colheita de cana. Assim, parte da palha continuaria na lavoura, protegendo o solo, preservando a umidade e virando adubo orgânico. Parte seria transformada em álcool ou até poderia ser queimada nas caldeiras, num cenário em que o bagaço fosse destinado à produção de álcool.
Segundo Kitayama, da Unica, caso a palha seja destinada cada vez mais à geração de bioenergia, juntamente com o bagaço, entre 2020 e 2021 o potencial energético do setor passaria para 28.760 megawatts/hora, “o equivalente a duas Itaipus”, compara Kitayama, que finaliza: “A cana não deveria mais ser chamada “de açúcar”, pois ela produz álcool e energia. Deveria ser rebatizada de cana bioenergética.”

Em busca do álcool celulósico

Dedini e o Centro de Tecnologia Canavieira pesquisam uma maneira viável de produzir etanol a partir do bagaço

O futuro do bagaço de cana está na produção de bioeletricidade e de etanol, diz o vice-presidente de Tecnologia e Desenvolvimento da Dedini, José Luiz Olivério. Segundo ele, as usinas já investem em equipamentos de “otimização energética”, como caldeiras de alta pressão, mas o desafio é produzir etanol do bagaço.

“O Brasil tem grande potencial para desenvolver a tecnologia do etanol a partir do bagaço.” Com mais de 20 anos de experiência em pesquisas de hidrólise ácida – processo pelo qual o bagaço é transformado em álcool -, a Dedini desenvolveu, na década de 80, a tecnologia DHR, que envolve a sacarificação ou hidrólise, a fermentação e a destilação.
Em 2004, em parceria com a Cooperativa de Produtores de Cana-de-Açúcar, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), a Dedini instalou, em Pirassununga (SP), unidade semi-industrial com capacidade de produção de 5 mil litros de etanol/dia. “Agora, vamos concluir a definição de parâmetros técnicos para o projeto de uma planta industrial. A idéia é disponibilizar a tecnologia completa no mercado nos próximos anos.”
O gerente de Desenvolvimento Estratégico Industrial do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), Jaime Finguerut, explica que a sacarose, o principal açúcar da cana, representa um terço da energia captada do solo pela planta. O restante é fibra. “O etanol feito de cana é obtido a partir de açúcares solúveis (sacarose) e nisso o País já é referência. O desafio é produzir etanol a partir do material celulósico.”
Por isso, além da hidrólise ácida, o País também está estudando a hidrólise enzimática. “A hidrólise é a quebra das fibras pela água e tem como objetivo recuperar os açúcares que formam essas fibras. E, para que as reações químicas necessárias ocorram, a pesquisa usa catalisadores, que podem ser ácidos ou enzimáticos”, explica. O CTC está pesquisando a via enzimática com uma empresa dinamarquesa.
“Na via enzimática o catalisador é uma molécula de proteína, a mesma usada por microrganismos na reciclagem de material vegetal. O conceito é o mesmo, mas na hidrólise, as proteínas mais potentes são isoladas.” Segundo ele, pode-se comparar a hidrólise a uma porta que precisa ser aberta. “A via ácida, que dissolve tudo em ácido, é como abrir a porta com uma marreta. Já a via enzimática seria abrir com a chave. É mais eficiente.”

O Estado de S. Paulo de 03/09/2008Editoria: Agrícola

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